
Escrito por Dr. Hannah K Shorrock
Editado por Dr. Celeste Suart
Traduzido para o Português por Priscila Pereira Sena
A acumulação de danos ao DNA sem a capacidade de reparo pode levar a uma cascata de efeitos negativos na SCA7, resultando na morte neuronal.
Por que os neurônios do cerebelo se degeneram na ataxia espinocerebelar do tipo 7 (SCA7)? Se os cientistas conseguirem encontrar a resposta a essa pergunta e identificar as vias celulares responsáveis pela morte neuronal, eles poderão desenvolver estratégias de tratamento direcionadas à restauração dessas vias. Eles poderiam até mesmo evitar o mau funcionamento das vias em primeiro lugar. Essa era a pergunta que Switonski e seus colegas do laboratório La Spada queriam responder: como e por que ocorre a degeneração dos neurônios na SCA7? A resposta, pelo menos até certo ponto, é o dano ao DNA.
A ataxia espinocerebelar do tipo 7, ou SCA7, é causada por expansões de repetição CAG no gene ATXN7, que codifica a proteína ataxina-7. Na SCA7, a expansão da repetição CAG na sequência de DNA do gene ATXN7 leva a uma expansão de poliglutamina na proteína ataxina-7, o que interrompe a sua função normal. As proteínas se dobram de maneiras muito complexas e específicas, para que possam se ligar – muito especificamente – a outras proteínas e componentes celulares, com os quais devem interagir para permitir que as proteínas desempenhem sua função normal. Quando as proteínas desempenham suas funções normais, isso mantém as células e os neurônios saudáveis.
A ataxina-7 normal (não-mutada) contém de quatro a 35 aminoácidos de glutamina enfileirados. Na SCA7, a ataxina-7 mutada contém de 37 a mais de 400 aminoácidos de glutamina em sequência. Não é de surpreender que o fato de ter tantos aminoácidos extras afete a forma como a proteína ataxina-7 se dobra e funciona. Isso, por sua vez, pode perturbar o equilíbrio da função proteica, que mantém as células e os neurônios saudáveis. Mas então, o que a ataxina-7 faz normalmente?
Encontrando uma ligação entre a ataxina-7 e as vias de dano e reparo ao DNA
A Ataxina-7 é um membro central de um complexo chamado “complexo coativador STAGA”. O STAGA é formado por muitas proteínas, que trabalham juntas para controlar o cenário da transcrição e da cromatina nas células. Em outras palavras, o STAGA garante que as regiões do DNA que precisam ser expressas (ou transcritas) estejam acessíveis, e que as regiões do DNA que não são necessárias estejam escondidas em “bolas” de DNA firmemente enroladas, conhecidas como cromatina. Isso é coordenado pelas histonas: proteínas que empacotam o DNA para armazenamento. O complexo STAGA contribui para o controle da acessibilidade ao DNA, alterando a quantidade de acetilação nas histonas presentes em regiões específicas do DNA. Se o DNA precisar ser usado, ou precisar sair do armazenamento, são feitas marcas nas histonas por um processo chamado acetilação e o DNA se torna acessível.
Na SCA7, os pesquisadores encontraram um aumento da acetilação de histonas em regiões promotoras de genes envolvidos nas vias de dano e reparo ao DNA. As regiões promotoras enviam sinais para o gene seguinte, para que seja feito o mRNA e, em seguida, a proteína. Não é de se surpreender, portanto, que os pesquisadores descobriram que os genes com aumento de acetilação de histonas no promotor apresentavam expressão aumentada. Em outras palavras, na SCA7, esses segmentos do DNA que deveriam estar armazenados, são retirados do armazenamento e utilizados mais do que deveriam. Isso sugere que a ataxina-7 mutante altera o modo como o complexo STAGA funciona, resultando em diferenças no acesso ao DNA, e aumentando a expressão de genes envolvidos no dano e reparo ao DNA.
Como os pesquisadores viram um aumento da expressão de genes de dano e reparo ao DNA ligado à interrupção do funcionamento normal da ataxina-7, eles se fizeram as duas seguintes perguntas:
- A mutação na ataxina-7 em SCA7 é suficiente para induzir danos ao DNA?
- A mutação na ataxina-7 em SCA7 leva ao comprometimento das vias de reparo ao DNA?
Os pesquisadores lançaram a hipótese de que alterações no dano e reparo ao DNA levam a uma cascada de eventos que resultam na disfunção e perda de neurônios na SCA7. Para testar essa hipótese e responder essas perguntas, os pesquisadores utilizaram uma variedade de sistemas-modelo, incluindo células precursoras de neurônios derivadas de pacientes, células granulares neuronais cultivadas a partir de tecido cerebelar de camundongos, e sistemas básicos de cultura de células. Os pesquisadores então introduziram segmentos extras de DNA para expressar a proteína ataxina-7 normal ou a mutada nessas células.
Aumento no dano, redução no reparo
Os pesquisadores analisaram a quantidade de gH2AX nas células para responder à primeira pergunta: a mutação SCA7 é suficiente para induzir danos ao DNA? gH2AX é um marcador específico para quebras de fita dupla de DNA, um tipo de dano ao DNA. Primeiro, eles analisaram células que expressavam a ataxina-7 normal ou a mutada, que foram introduzidas a essas células. Eles observaram níveis aumentados de gH2AX nas células que expressavam ataxina-7 mutada em comparação às células que expressavam a ataxina-7 normal.
Enquanto isso sugere que o dano ao DNA está aumentado em SCA7, o processo de introdução de DNA extra nas células por si só causa um estresse celular. Portanto, os pesquisadores em seguida analisaram modelos que expressavam ataxina-7 normal ou mutada sem a necessidade de introdução de um segmento extra de DNA, foram essas:
- Células precursoras neuronais derivadas de controle e de pacientes com SCA7
- Células granulares neuronais cultivadas de camundongos do tipo selvagem (controle) e SCA7.
Em ambos os sistemas, os pesquisadores encontraram níveis aumentados de gH2AX em SCA7. Isso mostra que a mutação em SCA7 é suficiente para induzir danos ao DNA na ausência de qualquer outro estresse celular adicional.
Normalmente, quando acontecem danos ao DNA, as células ativam vias para reparar o problema. Existem muitas vias diferentes de reparo ao DNA, que a célula pode utilizar dependendo do tipo de dano ao DNA que precisa de reparo. Para responder à Segunda pergunta – a mutação em SCA7 afeta as vias de reparo ao DNA? – o grupo usou um sistema repórter que testa se cada via de reparo do DNA está funcionando individualmente. Se a via de reparo ao DNA que corrige uma forma específica de dano ao DNA estiver funcionando, a célula vai expressar uma proteína verde fluorescente do sistema repórter.
O grupo descobriu que dois tipos de reparo ao DNA não funcionam corretamente em SCA7: reparo dirigido por homologia e reparo de recozimento de fita simples. Juntos, eles descobriram que isso levava a um aumento no DNA contendo éxons sendo anexados ou translocados para outros segmentos do DNA quando a ataxina-7 mutada é expressa pelas células. Como os éxons são as regiões do DNA que codificam as proteínas, isso pode levar a uma variedade de efeitos sobre o RNA e sobre as proteínas normalmente produzidas a partir desses segmentos de DNA.
O que acontece quando danos acumulam?
Se algumas vias de reparo ainda estão funcionais, por que o dano ao DNA faria com que os neurônios ficassem doentes e não funcionais? Para responder a essa pergunta, vamos imaginar um cenário: se você encontra uma poça d’água no chão da sua cozinha, existem várias pessoas que você pode chamar para ajudar, dependendo da origem da água: um buraco no telhado? Chame um telhadista; um vazamento embaixo da pia? Chame um encanador; o cano de água se rompeu e inundou a sua rua? Ligue para a autoridade local de água. Em cada caso, você precisa do conhecimento, das ferramentas e, em algumas situações, da autoridade correta para o trabalho. Se o cano principal de água estiver estourado, um telhadista não poderá ajudar, da mesma forma que é improvável que a autoridade local de água conserte um buraco no seu telhado.
Com danos e reparos ao DNA é a mesma coisa: se você acumular danos ao DNA e as vias de reparo que normalmente corrigem o problema não estiverem funcionando, o dano ao DNA (ou a água no chão da sua cozinha) vai acumular. Com o passar do tempo, isso levará a uma cascata de efeitos prejudiciais: depois de uma inundação, você talvez precise substituir os suprimentos nos armários inferiores da cozinha? Talvez o piso precise ser substituído? Ou talvez precise substituir completamente a cozinha? Infelizmente, os neurônios não podem ser substituídos. Eles podem reduzir alguns dos efeitos prejudiciais por um período, mas, com o passar do tempo, os neurônios continuarão a acumular danos, até não serem mais funcionais e acabarem morrendo.
Esse trabalho é o resultado de muitos anos de pesquisa para tentar entender como e por que os neurônios morrem na SCA7. Para começar a entender isso, primeiro foi necessário entender o que a proteína ataxina-7 normal faz. Com o conhecimento sobre o que a proteína ataxina-7 normal faz, é possível investigar como essa função está prejudicada na SCA7, e quais os efeitos disso na célula. Com o tempo, essa pesquisa identificou vias celulares que são afetadas na SCA7. Agora podemos então começar a entender a melhor forma de corrigir os danos a essas vias, evitar cascatas de efeitos prejudiciais e, por fim, esperamos melhorar a sobrevivência dos neurônios.
Palavras-chave
Éxon: regiões do genoma que estão presentes no mRNA maduro. As proteínas são codificadas pelo material genético localizado nos éxons. Nem todos os éxons codificam proteínas.
Reparo dirigido por homologia: uma via de reparo ao DNA que corrige quebras de DNA de fita dupla, utilizando um pedaço de DNA muito semelhante como modelo para o reparo. Se o modelo de DNA for idêntico à sequência de DNA original que está sendo reparada, esse processo geralmente não apresenta erros.
Reparo de recozimento de fita simples: uma via de reparo ao DNA que corrige quebras de DNA de fita dupla que ocorrem entre duas sequências repetitivas. Uma única fita de DNA é criada em cada lado da quebra do DNA e, como as sequências repetitivas de cada lado da quebra são iguais, essas sequências se unem (anelamento). Isso leva a um encurtamento da sequência de DNA, porque a região entre as duas sequências repetitivas é perdida.
Declaração de conflito de interesse
O autor e o editor declaram que não há conflito de interesse.
Citação do artigo revisado
Switonski, P. M., J. R. Delaney, L. C. Bartelt, C. Niu, M. Ramos-Zapatero, N. J. Spann, A. Alaghatta, T. Chen, E. N. Griffin, J. Bapat, B. L. Sopher and A. R. La Spada (2021). “Altered H3 histone acetylation impairs high-fidelity DNA repair to promote cerebellar degeneration in spinocerebellar ataxia type 7.” Cell Rep 37(9): 110062.
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